30 agosto 2014

Licença poética

Num pequeno poema de Mário Quintana, o primeiro verso dá um bom exemplo do que seja licença poética: a desobediência às leis gramaticais em prol da melhor expressão de um sentimento ou apenas da boa musicalidade. O verso original é este:
A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Só o hábito de ler bons autores com frequência possibilita perceber a sutileza contida numa licença poética como esta.
Pelo Facebook, já recebi de mais de uma fonte uma versão piegas do poema original. A versão naturalmente altera o verso inicial (que fica sendo A vida são uns deveres...), piora o texto e termina com o acréscimo de alguns pensamentos banais sobre o amor – coisa que Mário Quintana nunca escreveu.
A internet infelizmente é uma fonte de baixíssima confiabilidade. Há sempre alguém “melhorando” algo a seu bel-prazer, sem nenhum respeito pela autenticidade do que publica e, sobretudo, sem nenhum respeito pelo direito autoral.
A quem interessar possa, aqui vai o poema original de Mário Quintana – cujo título é Seiscentos e sessenta e seis, e não outro inventado por aí:

A vida é uns deveres que trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo...
Quando se vê, já é 6ª feira...
Quando se vê, passaram 60 anos...
Agora é tarde para ser reprovado...
E se me dessem – um dia – outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio,
seguia sempre, sempre em frente.

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil
das horas.


Licença poética

Num pequeno poema de Mário Quintana, o primeiro verso dá um bom exemplo do que seja licença poética: a desobediência às leis gramaticais em prol da melhor expressão de um sentimento ou apenas da boa musicalidade. O verso original é este:
A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Só o hábito de ler bons autores com frequência possibilita perceber a sutileza contida numa licença poética como esta.
Pelo Facebook, já recebi de mais de uma fonte uma versão piegas do poema original. A versão naturalmente altera o verso inicial (que fica sendo A vida são uns deveres...), piora o texto e termina com o acréscimo de alguns pensamentos banais sobre o amor – coisa que Mário Quintana nunca escreveu.
A internet infelizmente é uma fonte de baixíssima confiabilidade. Há sempre alguém “melhorando” algo a seu bel-prazer, sem nenhum respeito pela autenticidade do que publica e, sobretudo, sem nenhum respeito pelo direito autoral.
A quem interessar possa, aqui vai o poema original de Mário Quintana – cujo título é Seiscentos e sessenta e seis, e não outro inventado por aí:

A vida é uns deveres que trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo...
Quando se vê, já é 6ª feira...
Quando se vê, passaram 60 anos...
Agora é tarde para ser reprovado...
E se me dessem – um dia – outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio,
seguia sempre, sempre em frente.

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil
das horas.


16 agosto 2014

Uma fábula (muito) contemporânea

No tempo em que os animais falavam, reuniram-se certa vez, numa terra distante chamada Bambilândia, o frango, o pato e o ganso. Buscavam uma saída para a insolúvel questão da fragilidade avícola. Chamavam-se pelo nome:
– A natureza foi injusta conosco. Temos asas, como qualquer ave, mas não sabemos voar – reclamou o ganso Henrique.
– Isso nos torna presa fácil do terrível gavião – completou o pato Alexandre.
– Mas vocês dois pelo menos podem fugir para a água – rebateu o frango Rogério.
– E adianta? Há até peixe querendo nos pegar.
No calor da conversa e sentindo-se abrigados sob o arbusto murici, os três não perceberam a proximidade do porco e foram devorados.